Nasceu em São Paulo, em 1911 e faleceu, em 1994. “A pintura não precisa ser alegre, basta que seja triste verdadeiramente”.
Interessado desde criança, apenas pela pintura, logo abandona o curso primário, alegando total desinteresse pelas matérias. O mestre Antônio Rocco, seu professor de pintura, descobre casualmente o daltonismo de Baroni. Descendente de italianos prósperos, logo é examinado pelos melhores oftalmologistas de então. O diagnóstico é o pior possível – daltonismo total! Portanto, absolutamente incompatível com a carreira de pintor. Desestimulado por todos ingressa no comércio, vindo a trabalhar com os irmãos. Todavia, a arte fala mais alto! Abandona os negócios e tenta novamente o velho sonho. Baroni era um homem determinado! Já havia posto de lado o projeto de constituir família, para se dedicar integralmente à pintura. Da sua vida sentimental, tudo o que sobrou foi um maravilhoso quadro, por ele pintado, numa das paredes da sala de estar de sua casa, do único amor de sua vida – uma jovem de corpo inteiro, aparentando dezoito anos de idade. Baroni, nunca revelou o nome da jovem, nem falava sobre o assunto. Do jeito que o conhecemos, conseguimos imaginar a tremenda luta que travou face à paixão, em favor da arte. Assim, não seria o daltonismo que lhe frustraria o sonho de ser pintor. Durante anos, passa noites em claro, estudando a reflexão da luz. Naquele momento, mais importante que o desenho e as cores era o claro-escuro. Mais tarde, encontra uma solução prática para distinguir as cores – escreve-as nos pincéis e nos tubos de tinta! Os tons, as meias-tintas, são obtidas pela maior ou menor intensidade da reflexão da luz. Ou seja, através da luz e sombra. Entretanto, muitos poucos sabiam do daltonismo de Baroni. Alguns desconfiavam, mas não queriam crer dada a impossibilidade.
Baroni era diferente em tudo! Vivia entre a casa e o atelier; jamais entrou num shopping.
As fabulosas “figuras, em movimento”, eram o resultado de suas investidas ao Mercado Municipal, logo ao raiar do sol, onde passava horas observando os feirantes a descarregarem as carroças, bem como, os interiores de igrejas, que deram origem aos famosos “coroinhas”, às cenas sacras, à “Descida da Cruz” e à “Crucificação”. Estes eram os dois únicos lugares que faziam Baroni sair de casa.
Muitos achavam que Baroni era profundamente religioso, uma vez que, passava manhãs e tardes dentro de uma igreja. Todavia, as razões eram outras – a luz que vibrava dos paramentos litúrgicos, o claro-escuro que se formava entre a nave central das igrejas com o resto do templo e o espectro de luz irradiado pelos vitrais.
Baroni tinha como amigos, Scavone e Oehlmeyer. Ao final da tarde, encontrava-se com Scavone no bar que ficava no térreo do edifício onde ambos tinham atelier, na Praça João Mendes, no centro de São Paulo. As conversas eram as mesmas de sempre: pintura e, política! Scavone morre, em 1970, e Oehlmeyer, três anos mais tarde.
Baroni resolve mudar o atelier para a Avenida Aclimação, e instala-se num antigo edifício pertencente à sua família. Daí em diante, sua vida social resume-se a uma ou duas visitas por semana a outro pintor, que muito o admirava: Arnaldo Barbieri, também já falecido. Ao contrário de Baroni, de Oehlmeyer e de Scavone, Barbieri é extrovertido, falante e entusiasta.
Baroni, avesso à crítica, a entrevistas e ao que pensavam dele, sempre se negou a falar de si próprio, sequer permitia que alguém o fotografasse ou o visitasse no atelier. Depois de muita insistência acabou cedendo, mas, mesmo assim, avisou-nos que éramos privilegiados, pois não recebia ninguém! Logo em seguida, revelou-nos o seu grande interesse pela simplificação na pintura, e também, o desejo de divulgar a sua obra. Enquanto editávamos o seu filme, chega-nos a notícia que havia falecido. Baroni havia partido, mas a melhor parte dele ficou - “A Procissão”, “O Açougueiro”, “Descanso dos Trabalhadores”, “Crucificação”, “O Despejo”, “A Morte”, “O Milagre”, “O Julgamento” e tantos outros.
Ainda em vida, disputou vários Salões, mas muitos recusaram as suas obras; ora por inveja, ora por política, ou simplesmente porque duvidavam da sua autenticidade, pela rara beleza que mostravam. Naquela época, os salões eram muito importantes para os pintores, representavam o valor do artista. Apesar da corrupção e dos partidarismos políticos internos, constituía-se, até certo ponto, como único referencial de avaliação para os pintores. À semelhança de Oehlmeyer, Baroni sofre todo o tipo de descriminação e injustiça. Todavia, à medida que o tempo passa, Baroni surpreende cada vez mais, não só com a qualidade e a beleza, mas também, com a facilidade com que manipula as técnicas e os temas, vindo mais tarde a conquistar os melhores prêmios dos principais salões do país.
Cada centímetro quadrado da tela era objeto de estudo detalhado; desde a idealização da obra, passando pela composição, desenho, cores, escala cromática, arranjo de planos, até à sua realização. Na obra “A Procissão”, vê-se Nossa Senhora no andor e uma imensa multidão acompanhando a procissão. Baroni serviu-se apenas de três modelos: o seu motorista particular, o jardineiro e um mendigo que contratava de quando em quando. Porém, ao contemplar-se a obra, fica-se com a impressão de que todas as pessoas são diferentes.
Nos raros momentos de descontração, já que a pintura era a sua vida e lazer, conversava com a família ou assistia, sem prestar muita atenção, a algum programa de televisão. Ainda assim, sempre tinha por perto um lápis ou uma esferográfica e um pedaço de papel. Na falta deste, serviam-lhe os envelopes da correspondência recebida, ou até, extratos bancários, contas de luz e telefone, e às vezes, as próprias cartas; sempre rabiscando um detalhe ou esboçando uma nova idéia!
A obra “A Procissão”, ocupando meia parede da grande sala de jantar, assim foi realizada. Barone foi construindo aquele quadro por partes usando o papel de sacos de pão ou de embrulhos de compras sem fazer a menor idéia, pelo menos no princípio, a que proporções chegaria. Como ele mesmo dizia: “este quadro não foi feito, foi surgindo”.
A obra “O Açougueiro”, é tremenda, no sentido lato da palavra - um homem de avental branco, todo ensangüentado, empunhando uma faca na mão direita, enquanto a outra mão se apoiava sobre uma mesa, onde jaz um lombo de boi esquartejado, do qual brotava muito sangue. Trata-se de uma obra de grandes proporções, quase em tamanho natural, conferindo-lhe um inexorável realismo – é a obra preferida de Baroni.
Tudo aquilo que desperta a atenção de Baroni, logo lhe serve de tema para a próxima obra. Atento à realidade social de seu tempo, retrata como ninguém, o sofrimento humano, a pobreza e a solidariedade.
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